Preocupada com as causas do avanço da violência nas escolas, a deputada Carla Machado (PT), membro da Comissão de Assuntos da Criança, do Adolescente e do Idoso da Assembleia Legislativa do Estado do Rio de Janeiro (Alerj), propôs uma audiência pública, realizada nesta quarta-feira (10). Na ocasião, ela falou do seu projeto de lei para criação do Conselho de Segurança Escolar do Estado, voltado à prevenção de todas as formas de violência no ambiente escolar.
Com o tema ‘Violência na escola e contra a escola’, o encontro reuniu mais de 100 pessoas, entre especialistas em Educação, Saúde Pública e Assistência Social, alunos e pais. A deputada enfatizou a necessidade de se criar um conjunto de medidas que combatam as causas sociais que levam à violência escolar, incluindo a mediação de conflitos e o combate a todo tipo de preconceito, ajudando a promover uma cultura de paz nas escolas.
“O problema não está só no campo educacional. Precisamos buscar saídas pacíficas para esse problema tão complexo em sua origem, por meio de políticas públicas que busquem soluções efetivas. É preciso uma união de esforços para proteger a criança e adolescente”, disse. Carla voltou a defender mais investimentos do Estado no acompanhamento psicossocial dos estudantes. “Temos que ter uma educação não conteudista, mas que liberte”, completou ela, que é professora formada há mais de 40 anos.
Conselho de Segurança combaterá política de ódio
De autoria da deputada Carla Machado, o projeto de lei 716/2023, publicado no Diário Oficial no dia 13/4 e que aguarda votação, autoriza o Governo do Estado a criar o Conselho de Segurança Escolar do Estado do Rio de Janeiro, composto de forma paritária por representantes do poder público e da sociedade civil organizada.
“O conselho terá o dever de combater a política de ódio nas escolas, contribuindo para reduzir a violência escolar que atinge alunos e profissionais de Educação, identificando as causas mais comuns dos atentados e agressões, buscando saídas com a prática de políticas e programas que visem atender toda a comunidade escolar”, diz o texto.
Quatro vezes prefeita de São João da Barra, Carla disse que o município tem vários exemplos de políticas públicas integradas que deram certo e que podem ser replicadas no estado. Secretários municipais de São João da Barra, Anderson Campinho (Segurança Pública), Angélica Rodrigues (Educação), Arleny Valdes (Saúde) e Sharlene Barbosa (Assistência Social e Direitos Humanos) participaram do encontro. Pesquisadores divulgam documento
Durante a audiência pública, um grupo de mais de 100 pesquisadores de universidades e institutos de vários estados divulgou um documento propondo um conjunto de ações para combater a violência estrutural nas escolas. Entre elas: controle de posse e circulação de armas, enfrentamento ao bullying, ações de mediação de conflitos, atividades continuadas de cultura, lazer e valorização dos jovens, política educacional baseada no respeito à diversidade.
“Reunimos um grupo de pesquisadores para, juntos, pensarmos nessa questão importantíssima. Um ataque a uma escola não é um fato isolado. É parte de um ecossistema claramente falho. E cuidar da criança e do adolescente é um dever de toda a sociedade”, disse o deputado Munir Neto (PSD), presidente da Comissão. Ele encaminhará o documento ao governador Cláudio Castro e à secretária de Educação, Roberta Barreto.
Discursos de ódio na internet
A nota também propõe inteligência policial para combater na internet perfis propagadores de ódio e responsabilização das plataformas que abrigam tais grupos e criação de planos de ação para as escolas diante de situações de emergência. Para a estudante Pérola Magalhães, de 15 anos, mobilizadora da ‘Rede Não Bata, Eduque’, “os discursos de ódio propagados pela internet estão na base da violência escolar”.
O defensor público Roberto Azambuja se colocou à disposição para atuar junto às plataformas na remoção de conteúdo propagador de ódio. “Mais segurança é também mais alteridade e empatia.” O promotor Roberto Mauro salientou que o uso de segurança pública dentro das escolas não é a solução, e sim prevenção e pedagogia. Isso se dá com o controle do orçamento, que é fiscalizado pela Alerj.
Mediação de conflitos é uma das soluções
Ana Karina Brenner, professora da Faculdade de Educação da Uerj e integrante do Conselho Estadual de Educação, lembrou que a violência estrutural contra a escola é uma das mais antigas e abrangentes. Muitos dos presentes também se manifestaram contra a militarização e o uso de policiamento armado nas escolas, defendendo soluções, como a mediação de conflitos.
A psicóloga Naura dos Santos Americano, da Sociedade de Mediação de Conflitos (Somec- RJ), falou de sua experiência como mediadora de conflitos pelo Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro (TJ-RJ). Até 2018, como parte de um convênio com o Governo do Estado, ela e outro profissional do TJ capacitaram mais de 300 professores para realizar a mediação de conflitos em escolas estaduais.
A experiência, segundo Naura, foi muito exitosa e poderia ser replicada no atual contexto, de forma contínua, como medida preventiva. “Violência não é mediável, mas os conflitos que eclodem em condutas violentas. Na mediação, diferentes vozes são ouvidas e abrimos espaços de fala e escuta a alunos e professores. Não é algo mágico, requer continuidade e ação permanente para que eles possam se sentir pertencentes àquele espaço”, explicou.
Saúde mental de alunos e professores
Problemas na estrutura física das escolas, na quantidade de funcionários para atender à demanda e a necessidade de cuidar da saúde mental de alunos e professores também foram debatidos. A falta de psicólogos nas escolas estaduais e a retirada dos assistentes sociais contratados ano passado foram alguns dos pontos mais criticados por diversos convidados, já que uma legislação federal prevê a oferta desses profissionais pelo Estado.
O diretor do Sepe-RJ (Sindicato Estadual dos Profissionais de Educação), Diogo Andrade, trouxe um cenário da saúde mental desses profissionais, agravado pela violência imposta em operações policiais em comunidades. Segundo ele, de cada três afastamentos por doença, um é de Psiquiatria, o que aponta a necessidade urgente de se implementar um conjunto de ações que melhorem as condições de trabalho.
Ainda segundo Andrade, existe um déficit de 2 mil profissionais de educação hoje no estado, inclusive de mediadores para acompanhar estudantes com deficiências e transtornos. “O piso da Educação no Estado do Rio é o pior do país. No Acre é melhor. Aqui tem trabalhador recebendo menos de um salário mínimo”, denunciou, afirmando que nesta quinta-feira (11) a categoria decide se entra em greve no estado.
Pai da jovem Larissa Atanásio, de 13 anos, uma das 12 vítimas do massacre na Escola Tasso da Silveira, em Realengo, Zona Oeste do Rio, em 2011, também participou da audiência, cobrando mais professores concursados, psicólogos e inspetores nas escolas, além da instalação de detectores de metais. “Tem que ter psicólogo na escola para identificar os problemas das crianças e chamar os pais para conversar. Se tiver algum problema familiar mais sério, precisa levar para tratar na clínica da familia”.
Mais sobre a audiência
Também estavam presentes os deputados estaduais Pedro Brazão (União), vice-presidente da Alerj; Dani Balbi (PCdoB), Flávio Serafini (Psol), Elika Takimoto (PT), Otoni de Paula (PL), Professor Josemar (Psol), Sérgio Fernandes (PSD) e Tia Ju (REP). A Comissão deverá realizar também outras audiências públicas sobre o tema no interior. A próxima será dia 15, em Volta Redonda.
Fonte: Ascom