MAIS QUE REPRESENTATIVIDADE, É PRECISO OPORTUNIDADES, INCLUSÃO E EQUIDADE

A partir de uma convergência de ações, como a adesão do Tribunal Regional Federal da 5ª Região – TRF5 ao Pacto Nacional do Judiciário pela Equidade Racial e a realização de um evento inédito na Corte, para marcar o Dia Nacional de Zumbi dos Palmares e da Consciência Negra, o TRF5, através da Divisão de Comunicação Social, publica, a partir de hoje, a série “Consciência Negra e Atitude”, com três matérias especiais sobre equidade racial. O conteúdo mostra, sob o viés histórico e normativo, a importância de ações afirmativas para a inclusão de pessoas negras não somente no Judiciário, mas em todas as esferas da sociedade. Os textos são de Isabelle Câmara, Débora Lôbo e Cláudia Holder.

“Nós nos sentimos tão constrangidos com os olhares que, cinco minutos depois de entrar, saímos. Não nos expulsaram de forma verbal, mas eram olhares do tipo: o que vocês estão fazendo aqui?”. Um negro, a sensação de não pertencimento, a falta de representatividade, a discriminação e uma questão para refletir: o que faz com que uma sociedade, na qual mais da metade de sua população se declara negra (56%, segundo dados de 2021 do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística – IBGE) se depare com tantos casos de racismo? A declaração do professor Frederico Vitória da Silva Neto, 31, sobre situação vivida por ele e sua esposa, ao visitar a Faculdade de Direito do Recife (FDR), local de sua segunda graduação, retrata a realidade de muitos pretos e pardos no Brasil e pode encontrar explicação no processo de exclusão social da população negra, ocorrida ao longo da história do país.

A imposição de leis que proibiam as pessoas escravizadas e negras de terem acesso à educação, o não reconhecimento da cidadania e, em paralelo, a privação de direitos que eram concedidos apenas às pessoas brancas repercutem, até os dias atuais, nas condições existenciais de negros e negras. A primeira edição do estudo “Desigualdades Sociais por Cor ou Raça no Brasil”, publicada pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), em 2019, revela que o percentual de conclusão do ensino médio da população preta ou parda (61,8%), embora tivesse aumentado desde 2016 (58,1%), continuava inferior à taxa da população branca (76,8%). Publicada no mesmo ano, a Síntese de Indicadores Sociais (SIS) apontou que, em 2018, o percentual de pessoas negras entre 18 e 24 anos que cursavam o ensino superior (18%) era metade do percentual de pessoas brancas (36,1%).

A falta de representatividade nos espaços de poder, seja na educação, na política, na saúde ou nos cargos de liderança de uma empresa, e na mídia, também gera um impacto na negritude e é, da mesma forma, reflexo do preconceito que foi instituído ao longo da história. Chegar em um determinado ambiente, olhar para os lados e não enxergar um semelhante vai de encontro à diversidade, fundamental para a construção de uma sociedade mais justa e igualitária, e prevista em dispositivos legais, a exemplo do Estatuto da Igualdade Racial, instituído pela Lei nº 12.288 de 20 de julho de 2010. O normativo estabelece, em seu artigo 4º, inciso V, que “a participação da população negra, em condição de igualdade de oportunidade, na vida econômica, social, política e cultural do País será promovida, prioritariamente, por meio de eliminação dos obstáculos históricos, socioculturais e institucionais que impedem a representação da diversidade étnica nas esferas pública e privada”.  Além disso, a Constituição Federal de 1988, no artigo 215, §3º, inciso V dispõe que “a lei estabelecerá o Plano Nacional de Cultura, de duração plurianual, visando ao desenvolvimento cultural do País e à integração das ações do poder público que conduzem à valorização da diversidade étnica e regional”.

De acordo com a promotora de Justiça Irene Cardoso Sousa, integrante do Grupo de Trabalho sobre Discriminação Racial (GT Racismo) do Ministério Público de Pernambuco (MPPE), a falta de acolhimento gera um impacto psicológico nas pessoas que não se sentem representadas. “A negritude é uma relação muito de coletivo. Por exemplo, há 30 anos, quando eu entrava em uma biblioteca e via outra pessoa negra, mesmo que nós não nos conhecêssemos, nós trocávamos um cumprimento, porque era muito difícil, naquela época, encontrar uma pessoa negra na biblioteca de uma Universidade Federal”.

Presença negra no Poder Judiciário 

Apesar de a luta das pessoas negras por igualdade e respeito ainda ter um longo caminho a ser percorrido, a causa, antes abraçada exclusivamente por pessoas pretas, já começa a ganhar aliados. Os debates sobre temas relacionados à igualdade racial despontam, cada vez mais, como fundamentais para a eliminação do racismo estrutural presente no Brasil. O Judiciário Brasileiro vem adotando medidas para ampliar a representatividade das pessoas negras e elaborou o Pacto Nacional do Judiciário pela Equidade Racial. O Pacto consiste na adoção de programas, projetos e iniciativas em todos os segmentos da Justiça e em todos os graus de jurisdição, para combater e corrigir as desigualdades raciais, por meio de medidas afirmativas, compensatórias e reparatórias.

O principal objetivo é fortalecer uma cultura pela equidade racial no Poder Judiciário, a partir de um agir consciente, intencional e responsável, visando à desarticulação do racismo estrutural.

O Pacto é baseado em quatro eixos: Promoção da equidade racial no Poder Judiciário (fomento à representatividade racial no Judiciário e regulamentação de Comissões de Heteroidentificação nos Tribunais); Desarticulação do racismo institucional (formação inicial e continuada de magistrados em questões raciais e ações de prevenção e combate à discriminação racial no âmbito do Judiciário); Sistematização dos dados raciais do Poder Judiciário (aperfeiçoamento da gestão dos bancos de dados visando à devida e necessária implementação de políticas públicas judiciárias de equidade racial baseadas em evidências); e Articulação interinstitucional e social para a garantia de cultura antirracista na atuação do Poder Judiciário.

Para garantir a execução das ações previstas no Pacto, cada Tribunal possui a figura de um(a) gestor(a). No Tribunal Regional Federal da 5ª Região – TRF5, a gestora do Pacto é a desembargadora federal Cibele Benevides. Para a magistrada, a luta antirracista é um dever de todos: “É importante ter em mente as consequências devastadoras de 300 anos de escravidão no Brasil, abolida há apenas 135 anos, e a condição de exclusão e injustiça social que ordinariamente foi imposta às pessoas negras. Com essa consciência, é possível debater e fomentar a realização plena do princípio da igualdade previsto na nossa Constituição Federal, em busca de iguais oportunidades reais para todos, independentemente de raça ou cor.”

O Pacto reforça a importância da adoção de medidas afirmativas como políticas sociais para reduzir as desigualdades e incluir grupos historicamente marginalizados. Concessão de bolsas de estudos, auxílio financeiro e instituição de cotas para negros em instituições de ensino e em concursos públicos não representam “caridade”, mas constituem ações de reparação dos danos causados por anos de discriminação e exclusão do povo preto do país. “A história mostra o quanto determinada parcela da população foi colocada de lado e, por isso, ela precisa ser olhada de forma diferente”, explica a professora Maria da Conceição Reis, coordenadora do Núcleo de Políticas de Estudos Étnico-Raciais da Universidade Federal de Pernambuco (UFPE).

Ainda que recente, o Pacto tem sido avaliado de forma positiva por quem está à frente das ações que serão desenvolvidas para dar cumprimento ao previsto no projeto. A juíza federal Mara Lina, gestora do Pacto pela Equidade Racial no TRF da 1ª Região e titular da 14ª Vara Federal de Goiânia, acredita que o Pacto se soma ao sistema de cotas e já colhe bons frutos. “O Pacto é um marco nesse cenário de mudanças, nesse caminho que busca construir um Judiciário com equidade racial, um judiciário onde temos a redução das desigualdades raciais. E isso não se aplica somente aos juízes; se aplica, também, ao quadro de servidores e estagiários, porque a maioria dos servidores e estagiários é branca. Sem letramento racial não há como avançar”, pontuou.

Para a magistrada, é fundamental a participação negra no Judiciário. “Precisamos entender que olhares diversos, olhares vindos de outros espaços, que não seja somente o espaço homogêneo da branquitude, vai enriquecer o Judiciário, vai trazer maior legitimidade democrática às decisões e vai refletir a sua população”.

 

Por: Isabelle Câmara, Débora Lôbo e Cláudia Holder.
O NABALANCANF APENAS REPOSTA A NOTÍCIA QUE SE FEZ PÚBLICA SEM TECER QUALQUER COMENTÁRIO A RESPEITO DA MATÉRIA OU SE RESPONSABILIZAR PELA MESMA. TEM O CUNHO MERAMENTE INFORMATIVO.
Via
Por: Isabelle Câmara, Débora Lôbo e Cláudia Holder.
Fonte
TRF5

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