Desde sua inauguração em 2011, o Centro Judiciário de Solução de Conflitos e Cidadania (CESOL) acumula conquistas que se traduziram ao longo desses 12 anos em números expressivos e casos emocionantes. Em 2020, com a pandemia de Covid-19, o desafio de manter o atendimento ao jurisdicionado levou magistrados(as) e servidores(as) do Centro a buscarem formas de reinventar o trabalho. Mais de 10 mil pessoas recorreram ao Centro para receber o Auxílio Emergencial concedido pelo Governo Federal.
Somente nos dois últimos anos, a demanda por conciliação quadriplicou no CESOL. Em 2020, foram 4.674 atos judiciais, em 2021, 16.831 e em 2022 foram 12.567. Os resultados dos mutirões de conciliação de 2023, até o momento, mostram que quase metade de todo volume de audiências do TRF2 foi do CESOL-RIO (1402) e quase metade das sentenças homologatórias também.
A juíza coordenadora do CESOL, dra. Karina de Oliveira e Silva, que está à frente do Centro desde 2019, falou sobre as iniciativas, os desafios e projetos para atender ao cidadão que recorre à conciliação para solução das demandas judiciais, além de ações para promover uma maior aproximação da Justiça Federal com a sociedade.
A senhora está à frente do CESOL desde 2019, pouco antes da pandemia do Covid-19, como foi a adaptação do trabalho para atender o jurisdicionado durante o período de isolamento?
Dra. Karina: Por incrível que pareça, de modo intuitivo, nos antecipamos aos desafios da pandemia. Quando iniciei a coordenação do CESOL, no final de 2019, percebi que podíamos ganhar autonomia e celeridade se houvesse um fluxo processual todo dentro do e-Proc. Sendo assim, incentivei a equipe a capacitar-se e, em dois meses, tornamos toda a conciliação online.
Foi uma reviravolta, pois até então, o CESOL só fazia audiências previamente marcadas pelas unidades judiciais e tudo era no papel, para ser digitalizado e encaminhado para o juízo das demandas. Isto comprometia a celeridade e efetividade, pois todo o processamento era no juízo de origem, que tinha a tarefa de despachar, comunicar conosco, juntar peças digitalizadas. A partir desta mudança, as ações pré-processuais e processuais passaram a ser distribuídas ou encaminhadas pelos juízos diretamente pelo e-Proc, para realização de toda a tramitação desde o despacho inicial até a sentença, seguindo os parâmetros do art.8º da Resolução 125 do CNJ de 29/11/2010.
Então, quando em 15 de março de 2020 houve a Resolução 2020/00010 do TRF2 com a suspensão das atividades presenciais, já estávamos com todo o trabalho pelo e-Proc e isto facilitou muito, porém as audiências eram ainda todas presenciais. Por um mês e meio ficamos com cerca de 300 audiências acumuladas. Para não haver um prejuízo jurisdicional, fizemos um intenso esforço de adaptação, muitos servidores adquiriram câmera, computador e de forma remota o trabalho foi sendo realizado. A coordenação criou um grupo de comunicação interna, Google Drive, para realizar as tarefas comuns e passou a utilizar a plataforma Cisco Webex para realização das audiências. Capacitamos os advogados, entes públicos, conciliadores e os jurisdicionados que não sabiam fazer uso da plataforma. Foi um período de muito trabalho colaborativo, demos muitos cursos e houve muita interação entre o público interno e o externo para que tudo começasse a funcionar bem. Depois de alguns meses com as audiências funcionando normalmente nas plataformas online, realizamos pesquisas sobre a aceitação destas e obtivemos 98% de aprovação, o sucesso foi tanto que até hoje o público solicita que esta seja mantida.
Houve audiências que mais se destacaram?
Dra. Karina: Neste período de pandemia trabalhamos muito com as indenizações cíveis da CEF e as matérias comuns, mas o destaque maior foi para a conciliação relacionada ao Auxílio Emergencial. Foi um “boom”, pois recebemos cerca de cinco mil e-mails com pedidos de conciliação na matéria, em uma única semana. Em um projeto coordenado pelo NPSC2, passamos a transformar estas solicitações em Reclamações Pré-Processuais para negociação com a União Federal. Participamos dando todo o suporte à população hipossuficiente, para possibilitar o acesso destes ao Judiciário durante a pandemia, evitando que os Juizados entrassem em colapso. Foi um trabalho muito bonito, louvo o esforço da equipe, que trabalhou muito além do horário para dar conta, por um longo período, desta demanda.
Quais os tipos de ação mais recorrentes nas audiências?
Dra. Karina: Passado o período mais crítico da pandemia, retomamos as negociações com os entes públicos. A indenização civil com a CEF era a maior demanda, mas foi sendo superada pelas matérias atinentes aos servidores públicos. A União Federal criou uma equipe especializada em conciliação e passou a realizar em conjunto com o Centro um trabalho muito célere na solução dos litígios. Houve uma mudança social no pensamento pós pandemia: valor da segurança jurídica passou a ser permeado pela compreensão da impermanência da vida. A celeridade passou a ser mais importante do que a “certeza” jurídica. As pessoas e os entes públicos passaram a querer resolver a demanda o quanto antes, uma vez que o acordo solucionava imediatamente o problema que perduraria anos, cientes que se houvesse recurso talvez a pessoa sequer fosse receber em vida os valores pleiteados. Além disso, o prejuízo da manutenção de processos durante anos ficou mais evidenciado, especialmente pelo CNJ, que firmou vários entendimentos no sentido de conciliar. O resultado de tudo isto foi o quadruplicar da produtividade do Centro de Conciliação, que passou a trabalhar como as unidades jurídicas, processando e concomitantemente conciliando.
Qual o perfil do cidadão que mais recorre à conciliação?
Dra. Karina: De um modo geral, o cidadão que busca a conciliação é aquele que quer a máxima celeridade e abre mão de uma decisão judicial que diga quem tem razão e o quanto deve ser recebido. Na conciliação as partes conversam com base nos valores postulados na inicial e aceitam fazer o acordo com base na média dos valores emitidos em sentenças para o caso, sabendo que pode ser um pouco mais ou menos, mas que vão ganhar muito tempo e qualidade de vida na realização do acordo, pois será menos uma demanda para administrar. Também o hipossuficiente, sem advogado, busca na conciliação um apoio da equipe que o atende de maneira diferenciada, explicando todo o procedimento e orientando na decisão informada.
Algum projeto futuro para o Centro de Conciliação?
Dra. Karina: Sim, durante este período de pandemia houve uma aproximação dos jurisdicionados e percebemos que o Centro de Conciliação pode ser um local de humanização das relações, de amenização e prevenção de conflitos.
Pretendemos auxiliar os juízos a obter melhores resultados, a negociar parâmetros, conciliar e mediar em demandas complexas, pulverizadas ou em conflitos de alta carga emocional e afetiva, como é o caso de conflitos fundiários, cumprimento de sentença em títulos coletivos e Subtração Internacional de Crianças relacionada à Convenção de Haia.
Por conta disto, capacitamos a equipe para atuar nestes casos dando apoio aos JEFs e Varas, para isto criamos a Sala de Mediação Humanizada, que funcionará como um local para acolher estas demandas em parceria com as Unidades Judiciárias.
É importante relatar que hoje focamos, além da meta 3 de conciliação, na meta 9 do CNJ, que visa à aproximação do Judiciário com a sociedade. Cabe ao CESOL atuar no desenvolvimento de cidadania e prevenção de conflitos, logo, colaborar para o desenvolvimento de habilidades sociais no enfrentamento dos desafios relacionados às ODS (Objetivo de Desenvolvimento Sustentável da ONU) estabelecido para o Judiciário. Para tanto, estamos iniciando projetos em parceria com outros setores da Justiça como foram a exposição e as palestras na Jornada do Meio Ambiente em 2023, onde o CESOL atuou dando apoio a este importante tema ligado à sustentabilidade do planeta. E, em breve, lançaremos as rodas de conversas de cidadania com o objetivo de dinamizar a cidadania nos temas relacionados às ODS.
*Fonte: JFRJ