A Justiça Eleitoral não para e funciona, inclusive, em ano não eleitoral. Mas as atividades vão muito além dos julgamentos e das decisões proferidas pelo Tribunal Superior Eleitoral (TSE), em Brasília. Ao longo do ano, a Corte estabelece, por meio de normas e resoluções, as regras e diretrizes a serem seguidas pela Justiça Eleitoral, com os respectivos prazos divulgados no calendário eleitoral. É aí que entram em ação os 27 Tribunais Regionais Eleitorais (TREs).
Além de julgarem as ações que correm na instância inferior, os TREs possuem perfil executivo, ou seja, cabe a eles estabelecer os cronogramas de execução das tarefas. “O TRE vai estruturar, no estado dele, as diretrizes e estabelecer prazos e regras de controle, além de destinar os recursos para que essas atividades sejam cumpridas”, explica a assessora de Gestão Eleitoral do TSE Sandra Damiani.
Já o trabalho prático de concretização das ações e que envolve o dia a dia do eleitor – como o atendimento ao público e a prestação de serviços relativos a voto em trânsito, alistamento eleitoral, quitação de multas e coleta biométrica, entre outros – é feito pelos cartórios eleitorais, localizados nos 5.570 municípios brasileiros. “O TSE fala ‘o quê’, o TRE diz ‘como’ e o cartório faz”, explica.
Sandra Damiani complementa que cada cartório possui um juiz que está associado à respectiva zona eleitoral. “O TSE não faz eleição. O TRE não faz eleição. Quem faz eleição é o juiz eleitoral”, afirma. “A vida real passa pelo cartório eleitoral”, completa a assessora.
Eleições 2024 já começaram
As eleições começam um ano antes com a realização de testes de urna e a organização dos pleitos. Após cada votação, elas passam por limpeza e manutenção. Isso é importante para garantir que a eleição seguinte ocorra sem qualquer intercorrência. E, se for identificado algum problema, a urna poderá ser descartada e substituída a tempo do próximo pleito.
Os cartórios são responsáveis por fazer a geração e a carga das mídias, além de preparar, distribuir e testar cada urna eletrônica – o que ocorre de duas a três vezes por ano.
TRE determina auditorias
Também cabe aos TREs decidir, por exemplo, quais urnas serão auditadas. Isso pode ocorrer por votação ou por determinação do juiz eleitoral. As verificações são acompanhadas pelas Comissões de Auditoria da Urna Eletrônica.
“A coordenação de como deve ser feito, as entidades fiscalizadoras, a orientação de cadastramento, de imposição de regras e de definição de lugares auditados, tudo passa pelos TREs”, explica Sandra Damiani.
A convocação e o treinamento dos mesários também faz parte dessa rotina. Isso ocorre independentemente de a eleição acontecer a nível municipal, estadual ou federal, mas apenas em anos eleitorais.
Aumento da demanda
Assim como nos TREs, o trabalho dos cartórios se divide entre as atividades administrativas e as jurisdicionais. As demandas administrativas são voltadas ao atendimento dos eleitores e podem ocorrer de maneira presencialou on-line. Entre elas, estão o lançamento de decisões de suspensão e reestabelecimento de direitos políticos, a vistoria dos locais de votação (para verificar as adequações necessárias às próximas eleições) e o atendimento a projetos institucionais.
Já as demandas jurisdicionais visam autuar e instruir os processos de prestação de contas, cobrança de multasde mesários faltosos, andamento em inquéritos e processos criminais de fatos ocorridos nas eleições passadas.
Segundo o chefe do cartório eleitoral do município de Almirante Tamandaré, no Paraná, Frederico Almeida, em anos não eleitorais, como 2023, algumas demandas tendem a aumentar significativamente. Um exemplo é a retomada gradual do cadastro biométrico, que estava suspenso desde o início da pandemia. “Muitas pessoas também já estão procurando atendimento nos cartórios para atualização do título eleitoral”, conta.
Rotina intensa
Entre 2004 e 2017, a analista judiciária Kátia Maia de Souza atuou como chefe de cartórios na capital e no interior de Mato Grasso do Sul. Hoje, ela trabalha na Seção de Inspeções e Correições do TRE do estado. Ela acompanha se os cartórios cumprem as normas e as rotinas de funcionamento, bem como orienta os órgãos em caso de eventuais dúvidas.
“Temos uma rotina bastante intensa e que não para em ano não eleitoral, visto que os cartórios seguem funcionando normalmente e fazendo o atendimento e a tramitação dos processos”, explica. “E, nós, da Corregedoria, seguimos na orientação e no suporte dessas atividades”, relata.
Segundo ela, embora as demandas voltadas à realização das eleições diminuam, em ano não eleitoral, há um aumento na tramitação de processos judiciais e no número de atendimentos ao eleitor. “São demandas sazonais e que se mantêm constantes em termos de volume”, afirma Kátia, que também atua na orientação e no cadastro de usuários em sistemas disponibilizados pela Justiça Eleitoral (JE).
Relação com os partidos
Os partidos também mantêm relação direta com os TREs e os cartórios eleitorais. Os processos relativos à propaganda eleitoral e a prestações de contas das campanhas estaduais e municipais tramitam, originariamente, nesses órgãos da JE. E, em geral, a análise desses casos se estende nos anos seguintes às eleições.
“Os processos são autuados via PJe [Processo Judicial Eletrônico]. Cabe aos servidores do cartório fazer a análise e a movimentação dos processos”, relata a analista jurídica Iara Loureto Calheiros, da 5ª Zona Eleitoral de Boa Vista (RR).
As listas de apoiamento para a criação de novos partidos também são encaminhadas aos cartórios e aos Regionais. Já os registros de candidatura referentes às eleições municipais (prefeito e vereador) são feitos apenas nos cartórios eleitorais. E, nas eleições Gerais, nos TREs (governador, deputado federal, estadual/distrital e senador) e no TSE (presidente da república).
Eleições comunitárias
Os TREs e os cartórios eleitorais também oferecem suporte para a realização de eleições comunitárias de órgãos e entidades públicas, bem como de conselhos regionais de diferentes categorias profissionais, como a Ordem dos Advogados do Brasil (OAB).
As eleições dos conselhos tutelares também contam com apoio da Justiça Eleitoral. “Eles pedem emprestadas as urnas eletrônicas, a gente fornece, coloca o software e organiza”, esclarece Sandra Damiani. Em alguns casos, ainda são oferecidas urnas de lona e suporte logístico, inclusive para a contagem de cédulas de papel, caso seja necessário.
Grupos de Trabalho
A Justiça Eleitoral possui ainda 11 grupos técnicos de trabalho permanentes, formados por representantes do TSE e dos TREs, e que compreendem diferentes temas/áreas, como urna eletrônica, totalização, cadastro eleitoral, prestação de contas e mesários, entre outros.
Com duração de dois anos, os grupos têm a função de avaliar as atividades desenvolvidas pela Justiça Eleitoral em cada área e de propor alterações e aprimoramentos. As demandas são apresentadas pelos representantes dos TREs a partir de análise realizada junto aos cartórios eleitorais. “Esse movimento é constante”, afirma Sandra Damiani.
Os debates e análises ocorrem ao longo de todo o ano, mediante troca permanente entre os Regionais e os cartórios eleitorais. “As resoluções da Justiça eleitoral só são aprovadas depois que os debates e análises de cada grupo foram discutidos e sincronizados”, explica.
Os TREs também possuem grupos de trabalhos voltados à atuação regional. Kátia de Souza, do TRE-MS, faz parte da Comissão de Valorização e Participação Feminina, instituída em cumprimento à Política Nacional de Incentivo à Participação Feminina no Poder Judiciário do Conselho Nacional de Justiça (CNJ). “Nesse GT, temos a missão de promover eventos, debates de fomento à presença da mulher nos espaços de liderança e na política”, descreve.
DV/LC