Cabe aos agentes do estado provar que a confissão de que alguém armazena drogas dentro de casa foi voluntária e livre de qualquer coação e intimidação, de modo a justificar a invasão do local sem autorização judicial.
Com esse entendimento, a 6ª Turma do Superior Tribunal de Justiça deu provimento ao recurso especial ajuizado por um homem condenado a pena de 7 anos, 9 meses e 10 dias de reclusão, em regime inicial fechado, pelo crime de tráfico de drogas.
O acusado foi abordado na rua por guardas municipais, por estar em “aparente traficância”. Com ele, só encontraram R$ 38. Ao ser interrogado, admitiu que vendia drogas e informou que guardava em seu apartamento uma quantidade razoável de eppendorfs (pinos) de cocaína.
Essa confissão foi o que autorizou os guardas a invadirem a casa do suspeito, apreender as drogas e produzir as provas para sua condenação. Em juízo, o acusado disse que foi agredido pelos guardas e, para cessar a violência, admitiu a propriedade de drogas apresentadas por eles.
O Tribunal de Justiça de São Paulo condenou o réu por concluir que as falas dos guardas municipais, firmes e coerentes, se revestem de fé-pública e devem ser validadas, especialmente pela ausência de provas de que teriam intuito de prejudicar o acusado.
Relator no STJ, o ministro Antonio Saldanha Palheiro citou precedente segundo o qual a autorização do morador para que policiais invadam sua residência sem autorização judicial deve ser comprovada como forma de não deixar dúvidas sobre o seu consentimento.
A ideia é que voluntariedade do consentimento deve ser expressa e livre. “Esse mesmo raciocínio deve ser aplicado a casos como o em análise, haja vista a necessidade de se comprovar que a confissão foi voluntária e livre de qualquer coação e intimidação”, explicou.
No caso dos autos, apesar de policiais afirmarem que o réu confessou ter drogas em casa, em juízo ele negou a versão. Essa dúvida não pode ser resolvida em favor do Estado. Caberia aos agentes comprovar que a confissão foi espontânea e livre.
“Ausente a comprovação, nos parâmetros fixados por esta Corte, de que a confissão se deu de forma livre e sem vício de consentimento, de modo que se revela imperioso o reconhecimento da ilegalidade da busca domiciliar e, consequentemente, de toda a prova dela decorrente”, concluiu. A votação na 6ª Turma foi unânime.
AREsp 1.793.711
Danilo Vital é correspondente da revista Consultor Jurídico em Brasília.
Revista Consultor Jurídico, 3 de março de 2023, 18h47